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RESPONSÁVEL: Sérgio Gibim Ortega
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quarta-feira, 14 de julho de 2010

Carne humana

Airton Reis
Parágrafo sem travessão. Sujeito composto em página policial. Crime hediondo de manchete em manchete de jornal. Cidadania ameaçada em tempo real. Violência banal. Travessia sem timoneiro. Oficina sem obreiro. Torcida desfalcada além de um goleiro. Povo brasileiro no repente de uma liberdade tardia. Minas Gerais no cadafalso da covardia. Autoria que não se oculta aos olhos da justiça pela balança equilibrada. Espada da lei erguida e empunhada.

Carne humana transformada em refeição animal. Carne humana além das dores cortantes das navalhas. Carne humana em migalhas. Carne humana em miúdos que sangram além das margens de um papel timbrado. Carne humana de um ser exterminado pela barbaridade. Carne humana no jazigo de uma mesma saudade. Carne humana na intempestividade dita racional. Carne humana em página processual. Carne humana fracionada em fato nada corriqueiro. Carne humana sem ossada e sem coveiro.

Carne humana em desenlace no despetalar de uma rosa em botão. Carne humana em versos alados na eternidade da criação. Carne humana nos fragmentos sonorizados em mais de uma melodia celestial. Carne humana em partitura magistral. Carne humana em transmutação espiritual. Carne humana destituída da vida pela brutalidade que não se oculta nos capítulos de uma mesma legislação em vigor. Carne humana nos traços de uma única dor.

Carne humana em epílogo em nada teatral. Carne humana em réplica que não se escreve em qualquer dramaturgia. Carne humana com mais de uma valia preterida. Carne humana com mais de uma mordida no mesmo coração. Carne humana em dedos apontados para uma mesma ferida sem cicatrização. Carne humana em cativeiro sem salvação. Carne humana estrangulada em chave sem fechadura. Carne humana esfacelada em mais de uma estrutura corporal. Carne humana retaliada em função vital. Carne humana alvejada por mandante através do executor.

Carne humana sem ribalta. Carne humana sem público pagante. Carne humana sem picadeiro. Carne humana sem roteiro. Carne humana sem coxia. Carne humana em franca asfixia. Carne humana no cenário descortinado. Carne humana num chute certeiro e planejado. Carne humana numa rede interligada além da comunicação. Carne humana no placar de uma seleção em nada esportiva. Carne humana na pequena área de uma pátria viva em direito. Carne humana sangrando no lado esquerdo do peito de mais de um torcedor. Carne humana ceifada pelo desamor.

Carne humana nos braços do Pai e Criador. Carne humana na ampulheta do tempo universal. Carne humana de uma mãe sequestrada para morrer. Carne humana de uma madona habitante aquém da cidade da Torre de Pizza. Carne humana sem o rosto renascentista sorridente da Mona Liza. Carne humana de uma cidadã chamada Eliza. Fim!

Airton Reis é poeta em Cuiabá=MT.
airtonreisjr@gmail.com

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